HOMILIA NOSSA SENHORA DA SAÚDE
5º DOMINGO PASCAL, ANO A
Caros irmãos,
1. A história tem revelado a existência de uma maravilhosa aliança entre Nossa Senhora — a Virgem Maria — e a salvação da humanidade. Uma aliança intemporal que explica não apenas o mistério da vida e ação de Maria e do seu lugar na História, mas também o facto de a salvação de todos “explicar e justificar” que Nossa Senhora tenha tido um papel tão decisivo nos planos de Deus. A sua eleição e a maternidade divina estão, de facto, orientadas para a salvação do mundo, de todos, mulheres e homens, e da redenção da história.
Desde logo porque Maria é a encarnação da necessária cooperação que é solicitada ao ser humano na consecução do projeto da Redenção. De facto, sendo sempre de iniciativa divina e por Ele realizada, a salvação não prescinde, no entanto, da participação humana. Santo Agostinho amava sublinhar que “sem ti, nada faz Aquele que, mesmo sem ti, te criou”.
Nossa Senhora pronunciou historicamente aquele fiat, “faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38), através do qual o Eterno entrou no tempo, Deus fez-se homem e os olhos do mundo viram a salvação que Deus, na sua infinita bondade lhe havia preparado (cf Lc 2,30). Jesus Cristo está intimamente unido à Virgem Maria, Sua Mãe Santíssima, desde a Anunciação até ao fim dos tempos, porque Ele é e sempre será o nosso único e eterno Salvador, nascido de Maria.
2. Por isso, ó Maria, Nossa Senhora da Saúde, hoje elevamos o olhar da nossa contemplação para Caná da Galileia (Jo 2, 1-11) quando, naquelas bodas, veio a faltar o vinho do amor e da alegria e Tu, dirigindo-Te a Jesus, Teu Filho e nosso Redentor, disseste “Não têm vinho!” (Jo 2, 3) E Ele operou o maravilhoso milagre de transformar a água depositada nas seis talhas de pedra num delicioso néctar.
Também hoje, Nossa Senhora da Saúde, a humanidade se sente profundamente ameaçada por causa da terrível pandemia que a todos tem perturbado. Senhora, a humanidade sente-se perdida e transtornada, vem, por isso, em nosso auxílio, intercede mais uma vez por cada um de nós e por toda a humanidade. Não permitas que sejamos privados de paz em nossos corações, que nossas almas sejam atormentadas, que estejamos privados de vida. Dizei hoje a Jesus: “Senhor, não têm paz, nem alegria, nem sossego, nem vida!”
3. Senhora da Saúde, também nós fomos transportados até ao Calvário, onde Te encontramos junto à Cruz de Jesus (cf Jo 19, 25-27).
Mãe querida, permanece assim, junto de nós para que nos não sintamos órfãos e abandonados. Como Jesus foi crucificado, também nós, teus filhos, o somos devido à ameaça mortal de uma pandemia que nos pode roubar esses bens preciosos que são a saúde e a vida. Entregue a si mesma, a humanidade tem dificuldade em derrotar esse misterioso ser que nos reteve na solidão das nossas casas e tem abalado a saúde de tantas mulheres e tantos homens, muitos deles vítimas de atrozes sofrimentos e até da morte. Não nos abandones, entra na casa de cada um de nós como outrora aceitaste entrar na casa do discípulo amado e aí permaneceste como se da casa de teu próprio filho se tratasse (cf Jo 19, 27). Entra na morada da nossa intimidade e afugenta os medos que nos aprisionam. Torna-nos solidários com os outros, pois ninguém se salva sozinho e faz arder no nosso coração esse amor que o Teu filho Jesus anunciou e viveu.
4. Senhora da Saúde, hoje sentimo-nos novamente na companhia de Jesus que, como aos discípulos, também a nós nos diz: “Em verdade, em verdade vos digo: quem acredita em Mim fará também as obras que Eu faço e fará ainda maiores que estas, porque Eu vou para o Pai” (Jo 14, 12).
Fortalece e consolida a nossa fé para que, confiando na ação do Teu filho junto de nós, iluminados pela sua luz, inspirados pelos seus desígnios, nos tornemos trabalhadores dessas «obras maiores”. Na verdade, são obras que transcendem o horizonte individual de cada um e nos envolvem no serviço aos outros. Obras maiores porque feitas de dedicação, de amor e de entrega. Ultrapassando os limites do tempo, fazem-se eternas. Senhora da Saúde, pedimos-Te, pois, a graça de vencer o egoísmo com a bênção da bondade fraterna e solidária.
5. Mas, hoje, Nossa Senhora da Saúde, recordamos os distantes e dramáticos anos de 1569 e 1599, quando Lisboa caiu vítima da tenebrosa peste. Foi em Ti, de facto, que encontrou refúgio e salvação. Foi graças ao Teu precioso e materno auxílio que o flagelo cessou e a bonança voltou.
Ó Maria, Tu és o milagre da medicina divina que cura as nossas feridas do corpo e da alma e nos convoca a todos para sararmos uns aos outros as feridas que nos afligem. Com o bálsamo da Tua doçura maternal suavizas as mágoas que as quedas ao longo das estradas impérvias da vida provocaram em nós. Conforta-nos, protege-nos, vem em nosso auxílio e socorre-nos. Pois aqueles que amas estão novamente expostos ao perigo. E como nesse século XVI vieste em socorro da amada cidade de Lisboa para a salvar da peste devastadora, em sinal de atenta escuta das preces dos Artilheiros, hoje rogamos-Te, Nossa Senhora da Saúde, intercede por nós junto do coração misericordioso de Deus nosso Pai, pois estamos novamente em perigo.
Num famoso sermão sobre o Teu nascimento, ó Mãe de Deus, o Padre António Vieira exclamava: “Perguntai aos enfermos para que nasce esta celestial Menina, Maria, Mãe de Jesus, dir-vos-ão que nasce para Senhora da Saúde.”
6. Atende, Mãe gloriosa, como tens sempre atendido, a prece que hoje Te elevamos: que sejamos protegidos de todo o mal. Concede-nos, a nós e à nossa cidade, saúde, paz e esperança.
Nossa Senhora da Saúde, apresento-me hoje à Tua presença, no dia marcado para a gloriosa Procissão com que o santo Povo de Deus Te glorificava em gesto de louvor e agradecimento por teres protegido no passado a cidade de lisboa. A Teus pés me prostro, no Teu regaço me coloco, trazendo comigo, no coração e no pensamento, todos os que servem nas Forças Armadas e nas Forças de Segurança de Portugal.
Hoje, é nosso o Teu canto e, por isso, todos nós dizemos: “a minha alma glorifica o Senhor, e o meu espírito exulta em Deus nosso Salvador”( Lc 1, 46-27) porque com a Tua mediação fomos poupados a efeitos ainda mais nefastos desta pandemia. Graças a Ti, hoje podemos louvar-Te e bendizer-Te porque nos protegeste e com a Tua ternura nos defendes.
Dirigimos a Ti a nossa gratidão, Senhora da Saúde, porque nas horas dramáticas, quando Portugal nos chamou para a linha da frente para combater a pandemia, sentimos crescer, dentro de nós, Militares e Elementos das Forças de Segurança, o ardor da prontidão e a grandeza da disponibilidade para nos pormos ao serviço dos portugueses, oferecendo o nosso esforço, as nossas forças, a nossa ciência, a nossa vida.
Bendizemos-Te, Senhora da Saúde, por acalentares dentro da alma e do coração de cada um de nós um intenso espírito de dever, mas sobretudo a irrupção de uma renovada consciência de fraternidade onde se enraíza o sentido de solidariedade para com a Nação e uma ardente compaixão para com os mais frágeis.
Aos Teus cuidados maternais, Nossa Senhora da Saúde, confiamos todas e todos os que, na Marinha, no Exército, na Força Aérea, na Guarda Nacional Republicana e na Polícia de Segurança Pública, servem Portugal e os portugueses. Vela por eles, com a intensidade com que velaste nas bodas de Caná, para que a ninguém venha a faltar saúde, coragem e ardor no serviço.
Como no Calvário estiveste aos pés da Cruz de Jesus, continua presente junto a cada Militar e junto a cada Elemento de Segurança. E se a Cruz foi para a salvação do mundo, a ação das Forças Armadas e das Forças de Segurança é defender a vida e garantir segurança e dignidade a todos os cidadãos.
Nossa Senhora da Saúde, há camaradas que contraíram a infeção pandémica, estão doentes, afastados da família, privados do que amam. Para eles suplicamos o Teu materno auxílio, rogamos a Tua bênção, pedimos a Tua intercessão para que recuperem, sejam curados e regressem brevemente às suas famílias e ao labor do serviço da Pátria que tanto deles necessita.
Nossa Senhora da Saúde, rogai por nós e protegei-nos. Amen!
+Rui Valério
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança