No âmbito dos materiais para o “Ano da Misericórdia”, publica-se, de seguida, o texto do P. Agostinho Freitas, Capelão Adjunto para a Guarda Nacional Republicana, que ele apresentou ao clero do Ordinariato no encontro nacional, a 21 de Outubro.
O Rosto da Misericórdia
Apresentação aos Capelães Militares
Introdução
– Algumas considerações prévias:
Quando o Senhor D. Manuel me nomeou para fazer a apresentação deste documento do Papa Francisco, “Misericordiae Vultus”, ocorreram-me 3 ideias. Ainda não o tinha lido. Vi-as, depois, nele retratadas.
1.ª Etimologia da palavra Misericórdia
Foram anos a ouvir falar e a falar de misericórdia e nunca tinha reparado que ela é constituída pela palavra “coração”. Aprendi isso num dos 2 retiros que o P. Dário Pedroso, há poucos anos, fez aos Capelães Militares, na casa de retiros do Turcifal. “Cor/Cordis”. “Deus é coração debruçado sobre a nossa miséria”. Tanto me disse e continua a dizer aquela reflexão e a contemplação do coração de Deus debruçado sobre mim…
2.ª A atualidade do Conceito de Misericórdia
Li em tempos uma entrevista dum bispo oriental. Terá sido antes de o papa ter pensado na proclamação do ano da misericórdia e, se calhar, até antes da sua eleição para papa. Defendia: A Igreja deve evangelizar (e a igreja só serve para evangelizar…) fundamentalmente com de 2 conceitos: compaixão e misericórdia. “A quem me diz que são conceitos obsoletos, ultrapassados, medievais”, dizia o Bispo e continuava, “eu invoco uma mulher dos tempos de hoje: Madre Teresa de Calcutá”. “Só” fez isso…
3.ª O “Plano Pastoral de Jesus”
A 3.ª ideia que me ocorreu: “o plano pastoral de Jesus”. As dioceses têm estado absorvidas na elaboração dos seus planos pastorais. Alguns são tão complexos e por isso desencarnados da realidade. Jesus teve um plano de ação tão simples. Talvez tenha sido o seu plano pastoral que concorreu para a sua credibilidade, essa credibilidade de que o Papa fala neste documento: “Encheu-se de compaixão, aproximou-se, estendeu a mão e tocou-o”. E a gente pensa: mas Jesus não poderia curar sem tocar? Porque é que tocou nos olhos do cego (fez lodo com a saliva) e no leproso? Sabemos que sujou as mãos ao tocar o cego. Talvez também ao tocar o leproso.
(Lembramos que o Papa tem dito que prefere mais uma Igreja que, no seu propósito de ser uma “Igreja em saída”, suja as mãos do que uma igreja cândida mas estagnada. Alguém dizia que a Igreja não é nenhum “Museu” mesmo que de santos. É, antes, um Hospital de Pecadores)
Viria a encontrar estas 3 ideias retratadas neste documento que é dirigido “a quantos lerem esta carta”… Mas é sobretudo à Igreja que ele se destina. A palavra Igreja é a 2.ª mais usada. A primeira é, obviamente, misericórdia.
Foi apresentado, pelo Papa, perante a Porta Santa da Basílica de Latrão a um grupo representativo de responsáveis pelos vários dicastérios da Santa Sé. O Papa fê-lo como expressão do seu desejo de que o Ano Santo da Misericórdia não constitua apenas benefício para Roma, oportunidade de negócio dos seus os negociantes e comerciantes, mas deverá ser vivido e celebrado em todo o mundo, constituindo oportunidade de conversão.
Início do Ano:
8 de dezembro de 2015
Por 2 razões:
Primeira razão: porque a data coincide com a solenidade da Imaculada Conceição de Nossa Senhora. Esta “festa litúrgica, diz o Papa, indica o modo de agir de Deus desde os primórdios da nossa história… Deus não quis deixar a humanidade sozinha e à mercê do mal”. Por isso pensou e quis Maria santa e imaculada no amor… Perante a gravidade do pecado, Deus responde com a plenitude do perdão”
Segunda Razão: porque a data coincide com o 50.º aniversário da conclusão do Concílio Vaticano II, que é necessário “manter vivo” (4) que provocou a queda das “muralhas que, por demasiado tempo, tinham encerrado a Igreja numa cidadela privilegiada” (4). Com o concílio “chegara o tempo de anunciar o Evangelho de maneira nova. Uma nova etapa na evangelização de sempre” (4) O papa cita palavras de João XXIII, pronunciadas na abertura do Concílio, para ilustrar esta novidade: “ Nos nossos dias, a Esposa de Cristo prefere usar mais o remédio da misericórdia que o da severidade… A Igreja católica, levando, por meio desde concílio, a luz da verdade religiosa, deseja mostrar-se mãe amorosa de todos, benigna, paciente, cheia de misericórdia e bondade com os filhos dela separados” (4).
O documento é constituído por 25 pontos. Não tem outro tipo de divisões. Numa tentativa de melhor compreensão se divide em 3 partes e uma conclusão:
1.ª Conceito de “misericórdia”;
2.ª Propostas para a vivência e celebração do jubileu;
3.ª Apelos contra a criminalidade e corrupção, explicação da relação entre a justiça e a misericórdia e exortação ao diálogo inter-religioso
Na conclusão o Papa evoca Maria e outros santos e estimula a Igreja a nunca se cansar “de oferecer misericórdia”
1.ª Parte: Conceito de Misericórdia
- a) A Misericórdia é um Rosto: Jesus
O papa descreve os traços mais salientes da misericórdia situando o tema, antes de mais, sob a luz do rosto de Cristo: “Jesus Cristo é o rosto da misericórdia do Pai”. E diz que esta afirmação é “síntese” do mistério da fé cristã. Para o papa a misericórdia não é uma palavra abstrata mas um rosto. A misericórdia de que falamos tornou-se viva, visível e atingiu o seu climax em Jesus de Nazaré”. Este é um documento cristológico, teológico, trinitário e, obviamente, eclesiológico, veremos mais adiante)
O Papa apela, no início do documento, que contemplemos o mistério da misericórdia porque ela, diz: “é fonte de alegria, serenidade e paz… Revela o mistério da Santíssima Trindade… É o ato último e supremo pelo qual Deus vem ao nosso encontro… É a lei fundamental que mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que encontra no caminho da vida… É o caminho que une Deus e o homem, porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar da limitação do nosso pecado”.
- Tudo fala de Misericórdia em Jesus…
“Deus é amor” (I Jo 4,8.16)… Este amor tornou-se visível e palpável em toda a vida de Jesus. A sua pessoa não é senão amor, um amor que se dá gratuitamente. O Seu relacionamento com as pessoas, que se abeiram dele, manifesta algo de único e irrepetível. Os sinais que realiza, sobretudo para com os pecadores, as pessoas pobres, marginalizadas, doentes e atribuladas, decorrem sob o signo da misericórdia. Tudo nele fala de misericórdia. Nele, nada há que seja desprovido de compaixão (8)
(Portanto: não se consegue entender Jesus sem o conceito da misericórdia)
O Papa ilustra esta afirmação com narrações do evangelho:
… Vendo que a multidão de pessoas que o seguia estava cansada e abatida, Jesus sentiu, no fundo do coração, uma intensa compaixão por elas… Em todas as circunstâncias, o que movia Jesus era apenas a misericórdia. Quando encontrou a viúva de Naim que levava o seu único filho a sepultar, sentiu grande compaixão pela dor imensa daquela mãe em lágrimas… A própria vocação de Mateus se insere no horizonte da misericórdia. Ao passar diante do posto de cobrança dos impostos, os olhos de Jesus fixaram-se nos de Mateus. Era um olhar cheio de misericórdia que perdoava os pecados daquele homem e vencendo as resistências dos outros discípulos, escolheu-o, a ele pecador e publicano, para se tornar um dos Doze. São Beda o Venerável, ao comentar esta cena do Evangelho, escreveu que Jesus olhou Mateus com amor misericordioso e escolheu-o: miserando atque eligendo (com misericórdia o elegeu). Sempre me causou impressão esta frase, a ponto de a tomar para meu lema” (8)
- A misericórdia mostra a forma como Deus age para connosco
Nas parábolas dedicadas à misericórdia, Jesus revela a natureza de Deus como a de um Pai que nunca se dá por vencido enquanto não tiver absolvido o pecado e superado a recusa com compaixão e misericórdia:
– Parábola da ovelha extraviada
– da moeda perdida
– “Pai com os seus dois filhos”
Nestas parábolas, Deus é apresentado sempre cheio de alegria, sobretudo quando perdoa. Nelas encontramos o núcleo do Evangelho e da nossa fé, porque a misericórdia é apresentada como a força que tudo vence, enche o coração de amor e consola com o perdão (9)
- A Misericórdia é critério de identificação dos filhos de Deus
A parábola contém um ensinamento profundo para cada um de nós. Jesus declara que a misericórdia não é apenas o agir do Pai, mas torna-se critério para identificar quem são os seus verdadeiros filhos… O perdão das ofensas torna-se a expressão mais evidente do amor misericordioso e, para os cristãos, é um imperativo de que não podemos prescindir. Como parece difícil, tantas vezes perdoar! E, no entanto, o perdão é o instrumento colocado nas nossas frágeis mãos para alcançar a serenidade do coração. Deixar de lado o ressentimento, a raiva, a violência e a vingança são condições necessárias para se viver feliz. Acolhamos, pois a exortação do Apóstolo: Que o sol não se ponha sobre o vosso ressentimento.(9)
- A misericórdia é critério de credibilidade para a nossa fé
O Papa propõe que se escute “a palavra de Jesus que colocou a misericórdia como ideal de vida e como critério de credibilidade para a nossa fé: “felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia”. (9)
Deus não se limita a afirmar o seu amor para connosco (só palavras…), mas torna-o visível e palpável. O Seu amor nunca poderia ser uma palavra abstrata. Por sua natureza, é vida concreta: intenções, atitudes, comportamentos que se verificam na atividade de todos os dias. A misericórdia de Deus é a sua responsabilidade por nós. Ele sente-se responsável, isto é, deseja o nosso bem e quer-nos felizes, cheios de alegria e serenos… Tal como Ele é misericordioso, assim somos chamados também nós a ser misericordiosos uns para com os outros” (9) (ou seja: se a misericórdia é responsabilidade de Deus para connosco a misericórdia é responsabilidade nossa para com os outros, se quisermos que a nossa fé seja credível)
- Misericórdia é a arquitrave que suporta a vida da Igreja (Não é um suplemento, um acessório…) (10)
(O papa está convencido que é determinante para a Igreja que viva e testemunhe a misericórdia que faz com que seja merecedora da confiança dos homens. Não tem dúvidas que a igreja só vive uma vida autêntica quando professa e proclama a misericórdia. A misericórdia é decisiva para a forma como a Igreja se coloca no mundo…)
(Lembramos a história do Concílio Vaticano II… Havia um grupo de padres conciliares que pretendia que a igreja dissesse na constituição dogmática sobre ela mesma (Lumen Gentium) que ela é a Luz do mundo. Não foi essa a decisão do concílio. Cristo é que é a Luz. Mas esta luz resplandece no Rosto da Igreja. A Igreja não é a misericórdia… Mas, atenção, a Misericórdia é a arquitrave da vida da Igreja)
“A Arquitrave que suporta a vida da Igreja é a misericórdia. Toda a sua ação pastoral deveria estar envolvida pela ternura com que se dirige aos crentes… A credibilidade da Igreja passa pela estrada do amor misericordioso e compassivo… É triste ver como a experiência do perdão vai rareando cada vez mais na nossa cultura… Todavia sem o testemunho do perdão, resta apenas uma vida infecunda e estéril, como se se vivesse num deserto desolador… É o tempo de regresso ao essencial, para cuidar das fraquezas e dificuldades dos nossos irmãos. O perdão é uma força que ressuscita para a nova vida e infunde a coragem para olhar o futuro com esperança” (10)
O papa evoca depois a 2.ª encíclica do papa João Paulo II, “Dives in misericordia”, e diz que ela já foi resultado do “esquecimento em que caíra o tema da misericórdia, na cultura dos nossos dias” (11) e cita-a: A Igreja vive uma vida autêntica quando professa e proclama a misericórdia” (11). (Já o Papa João Paulo II o dizia, portanto).
- A misericórdia é determinante para a credibilidade do anúncio do Evangelho
A Igreja tem a missão de anunciar a misericórdia de Deus, coração pulsante do Evangelho, que por meio dela deve chegar ao coração e à mente de cada pessoa… É determinante para a Igreja, e para a credibilidade do seu anúncio, que viva e testemunhe, ela mesma, a misericórdia. A sua linguagem e os seus gestos, para penetrarem no coração das pessoas e desafia-las a encontrar novamente o caminho para regressar ao Pai, devem irradiar misericórdia. (12)
Faz um apelo:
“Onde a Igreja estiver presente, aí deve estar evidente a misericórdia do Pai”. Nas nossas paróquias, nas comunidades, nas associações e nos movimentos – em suma, onde houver cristãos – qualquer pessoa deve poder encontrar um oásis de misericórdia” (12)
2.ª Parte: Como Viver melhor o Jubileu
O Papa propõe algumas práticas para se viver melhor o Ano Santo:
- Escutar a Palavra de Deus (13)
O papa propõe que este Ano Jubilar seja vivido “à luz da Palavra de Deus”: Misericordiosos como o Pai” que diz ser “um programa de vida tão empreendedor como rico de alegria e paz” (13) Para tal recomenda a “escuta da palavra de Deus” que exige o “recuperar o silêncio” para poder ser meditada. Só deste modo se poderá contemplar a “misericórdia de Deus e assumi-la como próprio estilo de vida”.
- Abertura de Portas Santas em todas as dioceses
Anuncia que, no domingo seguinte ao 8 de dezembro, 3.º domingo do advento, 13 de dezembro, abrirá a Porta Santa da catedral de Roma, Basílica de S. João de Latrão e de seguida nas outras basílicas papais de Roma (3). E “estabelece” que neste domingo na Catedral de cada Igreja particular ou na concatedral ou então numa igreja de significado especial se abra igualmente, durante todo o ano santo, uma “porta da Misericórdia”. Por opção do Ordinário “ a mesma poderá ser aberta também nos santuários. Tem o papa intenção com estas propostas que o Jubileu se celebre também no âmbito local “ como sinal visível da comunhão da Igreja inteira” (3).
- Peregrinações (14)
(Peregrinar a um lugar santo, passar por uma porta… Quem quer que passe por uma porta santa que faça a experiência da misericórdia. Todos precisamos de ser perdoados… Todos: o papa usa e abusa desta palavra. Todos, sem excluir ninguém…)
“Um sinal de que a misericórdia é uma meta a alcançar que exige empenho e sacrifício. Por isso, a peregrinação há de servir de estímulo à conversão: ao atravessar a Porta Santa, deixar-nos-emos abraçar pela misericórdia de Deus e comprometer-nos-emos a ser misericordiosos com os outros, como o Pai o é connosco” (14)
- Não julgar, não condenar, perdoar e dar (14)
“Que mal fazem as palavras, quando são movidas por sentimentos de ciúme e inveja! Falar mal do irmão, na sua ausência, equivale a deixá-lo mal visto, a comprometer a sua reputação e deixá-lo à mercê das murmurações. Não julgar nem condenar significa, positivamente, saber identificar o que há de bom em cada pessoa e não permitir que venha a sofrer pelo nosso juízo parcial e a nossa pretensão de saber tudo”
Depois o papa diz que isto ainda não é suficiente para se exprimir a misericórdia. Diz: “Jesus pede também para perdoar e dar. Ser instrumentos do perdão, porque o obtivemos nós de Deus” (14)
- Abrir o coração às periferias existenciais… (15) “Que o mundo contemporâneo cria de forma dramática”.
(A peregrinação não é só física… Há que peregrinar às periferias… É uma peregrinação existencial. Este ponto parece ser o “coração” do documento)
“Neste jubileu, a Igreja sentir-se-á chamada ainda mais a cuidar destas feridas, aliviá-las com óleo da consolação, enfaixá-las com a misericórdia e trata-las com solidariedade e atenção devidas. Não nos deixemos cair na indiferença que humilha (tema recorrente do papa, por ex na mensagem da quaresma), na habituação que anestesia o espírito e impede de descobrir a novidade (“perdemos a capacidade de chorar”, disse o papa em Lampedusa), no cinismo que destrói. Abramos os nossos olhos para ver as misérias do mundo, e sintamo-nos desafiados a escutar o seu grito de ajuda. As nossas mãos apertem as suas mãos e estreitemo-los a nós para que sintam o calor da nossa presença, da amizade e da fraternidade. Que o seu grito se torne o nosso e, juntos, possamos romper a barreira de indiferença que, frequentemente, reina soberana para esconder a hipocrisia e o egoísmo” (15)
- Cumprir as obras de misericórdia corporais e espirituais (15)
Para “acordar a nossa consciência, muitas vezes adormecida perante o drama da pobreza, e de entrar cada vez mais no coração do Evangelho, onde os pobres são privilegiados da misericórdia divina”
Há que redescobrir as obras de misericórdia corporais e espirituais, apela o Papa. E lembra quais são:
Corporais: dar de comer aos famintos, dar de beber aos sedentos, vestir os nus, acolher os peregrinos, dar assistência aos enfermos, visitar os presos, enterrar os mortos.
Espirituais: aconselhar os indecisos, ensinar os ignorantes, admoestar os pecadores, consolar os aflitos, perdoar as ofensas, suportar com paciência as pessoas molestas, rezar a Deus pelos vivos e defuntos.
O Papa lembra, citando São João da Cruz: “ Ao entardecer desta vida, examinar-nos-ão no amor”
- Implementar nas Dioceses a iniciativa “24 horas para o Senhor”.
“A quaresma seja vivida mais intensamente como tempo forte para celebrar e experimentar a misericórdia de Deus. As liturgias da palavra deste tempo são propícias à redescoberta do rosto misericordioso de Deus” (17).
Neste contexto o papa propõe a iniciativa “24 horas para o Senhor” que será celebrada na sexta-feira e no sábado anteriores ao IV Domingo da quaresma, a implementar nas dioceses. O papa não fala em concreto como é que estas 24 horas devem ser organizadas mas conclui-se que devem ter uma grande componente penitencial porque, no contexto, diz: “há muitas pessoas e, em grande número, jovens, que estão a aproximar-se do sacramento da reconciliação e que frequentemente, nesta experiência, reencontram o caminho para voltar ao Senhor, viver um momento de intensa oração e redescobrir o sentido da sua vida”. Com convicção, ponhamos novamente o sacramento de Reconciliação no centro, porque permite tocar sensivelmente a grandeza da misericórdia. Será, para cada penitente, fonte de verdadeira paz”
O papa aproveita para dizer que jamais se cansará de “insistir com os confessores para que sejam um verdadeiro sinal da misericórdia do Pai. Ser confessor não se improvisa. (17) Tornamo-nos confessores quando “começamos, nós mesmos, por nos fazer penitentes em busca do perdão” (17) “ cada confessor deverá acolher os fiéis como o pai na parábola do filho pródigo: um pai que corre ao encontro do filho, apesar de lhe ter dissipado os bens” (17)
- Envio de Missionários da Misericórdia
O Papa anuncia que durante a quaresma enviará Missionários da caridade, sacerdotes a quem dará “o poder de perdoar os pecados que estão reservados à Sé Apostólica. Pede aos “bispos que convidem e acolham estes missionários”
Propõe que se façam “missões populares”, “de modo que estes missionários sejam anunciadores da alegria do perdão” (18)
- A indulgência (22)
Traço característico do jubileu, a indulgência mostra que “o perdão de Deus para os nossos pecados não conhece limites”.
O Papa explica:
“No sacramento da reconciliação, Deus perdoa os pecados, que são verdadeiramente apagados; mas o cunho negativo que os pecados deixaram nos nossos comportamentos e pensamentos permanece. A misericórdia de Deus, porém, é mais forte também do que isso. Ela torna-se indulgência do Pai, através da Esposa de Cristo, alcança o pecador perdoado e liberta-o de qualquer resíduo das consequências, habilitando-o a agir com caridade, a crescer no amor em vez de recair no pecado” (22)
A indulgência é experimentar a santidade da Igreja que participa em todos os benefícios da redenção de Cristo.
3.ª Parte
- a) O Papa lança alguns apelos…
Diz porque os lança:
“ Para que a palavra do perdão possa chegar a todos e o chamamento para experimentar a misericórdia não deixe ninguém indiferente” (19)
– A membros de grupos de delito
– Criminosos
“Peço-vos que mudeis de vida. Peço-vo-lo em nome do Filho de Deus, que, embora combatendo o pecado, nunca rejeitou qualquer pecador. Não caiais na terrível cilada de pensar que a vida depende do dinheiro e que, à vista dele, tudo o mais se torna desprovido de valor e dignidade… Não levamos o dinheiro connosco para o Além… A violência usada para acumular dinheiro que transpira sangue não nos torna poderosos nem imortais. Para todos, mais cedo ou mais tarde, vem o juízo de Deus, do qual ninguém pode escapar” (19)
– Corruptos
“O mesmo convite chegue também às pessoas fautoras ou cúmplices de corrupção. Esta praga putrefacta da sociedade é um pecado grave que brada aos Céus, porque mina as próprias bases da vida pessoal e social. A corrupção impede de olhar para o futuro com esperança, porque, com a sua prepotência e avidez, destrói os projetos dos fracos e esmaga os mais pobres. (Os pobres são, portanto, as maiores vítimas da corrupção). É um mal que se esconde nos gestos diários, para se estender depois aos escândalos públicos” (19)
- b) Relação entre justiça e misericórdia (20 e 21)
“Não são dois aspetos em contraste entre si, mas duas dimensões duma realidade que se desenvolve gradualmente até atingir o seu clímax na plenitude do amor” (20).
O papa lembra que Jesus rejeita o “legalismo” ou a “mera observância da Lei” (Lembramos o que disse Jesus: “Se a Vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus não entrareis no Reino dos Céus”). Para o papa “a Justiça de Deus é o Seu perdão” e “o primado da misericórdia é a dimensão fundamental da missão de Jesus, porque não é a observância da lei que salva, mas a fé em Jesus Cristo”
“A misericórdia não é contrária à justiça, mas exprime o comportamento de Deus para com o pecador, oferecendo-lhe a nova possibilidade de se arrepender, converter e acreditar” (21)
O papa chega a dizer que “Se Deus se detivesse na justiça, deixaria de ser Deus; seria como todos os homens que clamam pelo respeito da lei. A justiça por si só não é suficiente… Por isso Deus, com a misericórdia e o perdão, vai além da justiça. Isto não significa desvalorizar a justiça ou torna-la supérflua… Deus não rejeita a justiça. Ele engloba-a e supera-a num evento superior onde se experimenta o amor, que está na base duma verdadeira justiça” (21)
- c) Diálogo Inter-religioso
O Papa considera que “A misericórdia possui uma valência que ultrapassa as fronteiras da Igreja”. E diz que o Judaísmo e o Islão consideram a misericórdia como “um dos atributos mais marcantes de Deus”. (23)
O papa espera que o Ano Jubilar, vivido na misericórdia, possa favorecer o encontro com estas religiões e com outras nobres tradições religiosas” (23)
Conclusão
O Papa invoca Nossa Senhora…
a Quem designa de “a Mãe da Misericórdia”. “A doçura do Seu olhar nos acompanhe neste Ano Santo, para podermos todos redescobrir a alegria da ternura de Deus” Diz que “ninguém, como Maria, conheceu a profundidade do mistério de Deus feito homem. Na sua vida, tudo foi plasmado pela presença da misericórdia feita carne” (24)
Invoca os santos…
“que fizeram da misericórdia a sua missão vital” (24). Cita concretamente Santa Faustina Kowalska que “foi chamada a entrar nas profundezas da misericórdia divina” (23) (chamou-me a atenção o facto de ser a única referência feita quando há tantos santos que fizeram da misericórdia a sua conduta, por ex Santa Teresa de Calcutá. Fui ver porquê… Santa Faustina é uma santa polaca que viveu no século XX. Ficou conhecida pelas revelações que Jesus lhe fez sobre a misericórdia. Foi canonizada pelo Papa João Paulo II no 2.º domingo da Páscoa que a partir desse momento, por decisão de João Paulo II, ficou a ser designado pelo “domingo da misericórdia”)
O documento termina… (25)
apelando a que nos “deixemos surpreender por Deus. Ele nunca se cansa de escancarar a porta do seu coração, para repetir que nos ama e deseja partilhar connosco a sua vida”…
“ Que a Igreja nunca se canse de oferecer misericórdia e seja paciente a confortar e perdoar”
Na solenidade de Cristo Rei, que será a 20 de novembro de 2016, o ano jubilar irá terminar… Mas a Igreja continuará a proclamar com confiança e sem cessar: “ Lembra-te, Senhor, da tua misericórdia e do teu amor, pois eles existem desde sempre” (Sl 25, 6)… E para sempre.