«Na solidariedade, a cura»

Caros irmãos, em Cristo

1. Nenhuma outra circunstância da vida suscita tão forte solidariedade como a da vulnerabilidade da doença. É esta a experiência que, desde sempre, se verifica, tanto na sociedade civil como no contexto militar. Hoje gostaria de fazer acompanhar de uma reflexão a minha afetuosa saudação aos irmãos e irmãs doentes, bem como a quantos cuidam deles: debrucemo-nos sobre a importância e o valor da solidariedade, mais precisamente sobre a solidariedade perante a enfermidade.

2. Desde logo, ser solidário exprime humanidade e humanismo enquanto força de união entre as pessoas. E, não obstante a doença seja uma experiência profundamente pessoal, nunca é totalmente individual, precisamente porque suscita em todos um sentido de comunhão, de mais participação: o sofrimento de alguém suscita sofrimento nos outros, embora este seja um sofrimento diverso e de um nível diferente. Nesse sentido, verificamos que há uma bênção inerente à condição da doença e que se traduz na comunhão que segera mediante essa participação e essa fraternidade.

3. Mas o mistério da solidariedade na doença não se esgota aí. Qual a raiz profunda do facto de ninguém ficar indiferente perante alguém que sofre? O segredo desta envolvência reside na interioridade do ser humano. No homem, para além da corporalidade dos membros fisicamente observáveis, existe a alma – o imenso universo das emoções, dos sentimentos, da consciência:ora a solidariedade pertence à gramática desse universo: a sua linguagem é a linguagem do amor… e não um facto biológico. Assim, podemos dizer que a solidariedade face à doença é, por excelência, uma expressão do nosso ser enquanto pessoa humanaOuso mesmo dizer, é a maior expressão da nossa condição dhomem ou mulher que somos.

4. Por fim, gostaria de, nesta hora, sublinhar que a vocação à perfeição move o homem a ser autenticamente humano: curar o que está ferido, salvar o que anda perdido, reparar o que foi danificado essa sede de completude é inata à sua natureza, e tudo em vista da totalidade com o intuito de plenitude. É na obra criadora e amorosa de colmatar os ângulos vazios da existência, tantas vezes solitária, incompreendida e de preencher as crateras dilacerantes do sofrimento, é aí que muito me apraz enxergar a grandeza da solidariedade. O próprio Jesus viveu a solidariedade plena connosco, não só porque assumiu como suas a condição evulnerabilidade humanas, mas também porque (com o seu amor, suas palavras, seus gestos) nos reparou do desalento, nos curou as feridas, nos transmitiu esperança.

Com todos vós me sinto solidário e partilho a minha amizade; por vós também ofereço as minhas orações, confiando às mãos do Senhor as vossas melhoras e o vosso serviço.

Bem-haja

+Rui Valério, Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança

Lisboa, 11 de fevereiro de 2022