Eis a mensagem do nosso Bispo para esta quadra forte da Quaresma/Páscoa.

 

Mensagem para a Quaresma/Páscoa:

O dom de Deus, da conversão e dos irmãos.

 

No dia 1 de Março, começa aquele a que o povo crente chama “o santo tempo da Quaresma”, preparação intensa da Páscoa do Senhor, ponto cimeiro do calendário cristão. Sendo este, portanto, um tempo absolutamente especial, é costume que os bispos apelem os seus fiéis a que o vivam com magnanimidade e entusiasmo. É o que pretendo com esta simples mensagem.

  1. Sob o exemplo de Maria

O Concílio Vaticano II diz-nos que a Virgem Maria é “membro eminente e inteiramente singular da Igreja, seu tipo e exemplar perfeitíssimo” (LG 53). A Mãe de Jesus não está acima da Igreja: está dentro dela para nos servir de modelo. Assim sendo, neste ano centenário das aparições de Fátima, ano favorecido pelo acontecimento evangelizador que é a participação do Papa Francisco na peregrinação à Cova da Iria, desejo reflectir convosco a partir deste exemplo ou tipo.

A julgar pelos relatos da Irmã Lúcia, a Senhora que aparecia na azinheira era bastante comedida nas palavras. A 13 de Maio, perante o olhar esbugalhado de espanto dos pastorinhos, pouco mais disse do que isto: “Quereis oferecer-vos a Deus […] em reparação dos pecados […] e de súplica pela conversão dos pecadores?”.

Nesta interrogativa encontramos os três elementos fundamentais da existência cristã. Vale a pena demorarmo-nos um pouco neles.

  1. Deus como referência absoluta

A fé não é uma simples arte de viver, uma filosofia da acção, uma tradição mais ou menos aceite. Fé é a tomada de consciência e o contínuo fortalecimento dos laços que nos ligam a um Mistério de Amor que nos envolve: é o dar-se conta de que d’Ele vimos, n’Ele vivemos, para Ele vamos. Fé é a alegria de sabermos que, com Deus, a nossa vida tem sentido e que mesmo os momentos-limite da dor e da morte são redimidos pela abertura ao eterno convívio com Ele. Fé, por conseguinte, é o aceitar esta salvação que dá sentido à vida e nos projecta para um destino feliz.

Caros militares e polícias, sintamo-nos felizes por este dado que, infelizmente, não é experimentado por todos. No nosso meio, ajudemos a espalhar este acalentamento do Amor que reacende as velas baptismais dos nossos camaradas que as deixaram apagar ou que se encontram com chama muito ténue. Aceitemos dialogar sobre as questões da fé que todos colocam e a alguns afligem. E, fundamentalmente, não desanimemos de continuar a caminhar lado a lado com Aquele que tantas vezes experimentamos como quase sensível, mas que, outras vezes, como que se esconde a ponto de nos sentirmos em plena “noite da fé”. Coragem! Caminhemos, cristãos! Caminhemos animosamente porque mesmo que O não vejamos, Ele caminha connosco!

  1. A “reparação dos pecados”

É próprio da nossa condição humana a formulação de contínuos juízos de valor sobre os nossos actos. A partir de dentro, da “consciência, sacrário onde o homem se encontra a sós com Deus” (GS 16), descobrimos acções que podemos classificar de boas, justas, rectas. E que nos geram contentamento. Mas também descortinamos outras que nos repugnam, que achamos mal e nos causam vergonha, tristeza e dor.

Sim, chamemos-lhe mal, asneira, erro, pecado ou outro termo equivalente, damo-nos conta de que se impõe um aperfeiçoamento de vida, um contínuo esforço de passagem de acções más para as boas. Ou até da omissão das acções para o empenho no que deve ser feito. Isto é o que chamamos arrependimento, conversão, propósito de melhoria, mudança de vida.

Neste “tempo de salvação”, não deixemos de formular algum propósito de mudança. Não pensemos em muitos, pois dificilmente os cumpriríamos. Mas formulemos um ou dois, muito simples e concretos, especialmente na relação com a família, com os camaradas ou com Deus.

  1. A “conversão dos pecadores”

É importante esta referência. E não só por motivos ético-religiosos. Mas, fundamentalmente, por razões antropológicas e sociais.

Para a mente infantil dos pastorinhos, os “pecadores” seriam as pessoas mais intratáveis, perigosas e, porventura, malfeitoras. Por exemplo, seriam aqueles que, naquela época conturbada do republicanismo anti-clerical e de materialismo soviético, perseguiam a Igreja, incendiavam os templos, blasfemavam de Deus.

Curiosamente, quando tudo parecia aconselhar que essas pessoas fossem ignoradas, a Senhora manda tê-las em conta, relacionar-se com elas por intermédio da oração, estabelecer pontes e não muros. Esta referência funciona, portanto, como um símbolo: a impossibilidade de um cristão se fechar em si e de não ter em conta os outros. A todos. Mesmo aos que parecem mais “pecadores”.

Conclusão

Caros cristãos que servis as Forças Armadas e as Forças de Segurança, insto-vos a viverdes religiosamente esta Quaresma e Páscoa, firmes nesta tríplice vertente: abertura a Deus, conversão dos males morais e empenho pelos outros.

Como expressão disto, proponho muita generosidade na nossa costumada partilha quaresmal. O resultado desta recolha –da qual, a seu tempo, se dará pública notícia- destina-se ao seguinte: 50% para acorrer a situações particularmente graves de militares e polícias ou suas famílias; outros 50%, para enviar para Timor-Leste, para um destino concreto a ser indicado pelos bispos de lá, já que, proximamente, receberemos, para formação e partilha de experiências, o sacerdote que irá lançar a assistência religiosa às Forças Armadas locais. E meditai, por favor, na bela mensagem que o Papa Francisco nos mandou para este tempo: “A Palavra [de Deus] é um dom. O outro é um dom”.

Boa Quaresma. Feliz Páscoa!

O vosso irmão e amigo,

+ Manuel Linda