NO CORAÇÃO ESTÁ ESCRITA A LEI DE CRISTO
Hoje aceitamos o desafio lançado por S. Paulo, numa passagem da Carta aos Romanos, a propósito da fonte e fundamento da conduta de cada pessoa: “não são os que ouvem a Lei que são justos diante de Deus, mas os que praticam a Lei é que serão justificados. Com efeito, quando há gentios que, não tendo a Lei, praticam, por inclinação natural, o que está na Lei, embora não tenham a Lei, para si próprios são lei. Esses mostram que o que a Lei manda praticar está escrito nos seus corações, tendo ainda o testemunho da sua consciência tal como dos pensamentos que, conforme o caso, os acusem ou defendam” (Rm 2, 13-15).
Mais do que denunciar uma dicotomia entre os que ouvem e os que cumprem a Lei, São Paulo refere uma grandeza maravilhosa presente dentro de cada um, na nossa interioridade, a que ele chama «Lei escrita em nossos corações». E a verdade é que vivemos tempos que exigem uma séria reflexão, para a qual vem mesmo a propósito a palavra do Apóstolo.
Antes de mais, temos de tomar consciência de que as dúvidas do momento, o contacto direto e quotidiano com um ainda muito desconhecido vírus, podem gerar incerteza em nós. Incerteza significa hesitação, não saber bem para onde ir, nem o que fazer… e este é o terreno favorável para surgirem ditames que, às duas por três, se tornam leis, princípios inquestionáveis, regras infalíveis de vida…
Atenção!!! Dentro de cada um de nós, assevera-nos o convertido da estrada de Damasco, está inscrita a Lei, a luz que nos indica “o que há de melhor a fazer” (Rm 2, 18). Por isso, sugiro que ninguém deixe de reentrar dentro do seu coração, ninguém abdique de frequentar a sua interioridade e que não desista de escutar a voz da consciência.
Como ensina o Concílio Vaticano II, no coração está escrita a lei de Cristo: «No mais profundo da consciência, o homem descobre uma lei que não se deu a si mesmo, mas à qual deve obedecer e cuja voz ressoa, quando necessário, aos ouvidos do seu coração, chamando-o sempre a amar e fazer o bem e a evitar o mal […]. De facto, o homem tem no coração uma lei escrita pelo próprio Deus […]. A consciência é o núcleo mais secreto e o sacrário do homem, no qual ele se encontra a sós com Deus, cuja voz ressoa na intimidade do seu ser» (Gaudium et spes, 16).
Ao mesmo tempo, temos de dedicar tempo e libertar espaço na vida do dia a dia para essa escuta. A Igreja tem, a esse propósito, uma longa experiência que partilha connosco indicando-nos que o caminho para a escuta da consciência, de modo a saber como agir na vida concreta, reside na sabedoria do silêncio e na prontidão da disponibilidade. Através do silêncio, obtemos o clima para escutar a interioridade profunda onde o Espírito fala. A pronta disponibilidade coincide com o empenho e compromisso na feitura de um mundo renovado à luz da afirmação da dignidade do ser humano.